“A Ortodoxia manifesta-se, não dá prova de si”

ok

domingo, 21 de março de 2010

O Quinto Domingo da Grande Quaresma – Domingo de Santa Maria do Egito

Não é possível estabelecer com precisão o que é a história e o que é lenda nas tradições relativa a “Santa Maria do Egito”. Deve-se admitir simplesmente o fato de a Igreja ter querido fazer dela, como o cantamos nas matinas: “um exemplo de arrependimento”. Ela é um símbolo de conversão, de contrição e de austeridade. . Ela exprime, neste último domingo da Quaresma, o derradeiro, o apelo mais urgente que a Igreja nos dirige antes dos dias sagrados da Paixão e da Ressurreição.

A Epístola lida na Liturgia (Hb. 9, 11-14) compara o ministério de Cristo ao do Sumo Sacerdote hebreu, que entrava uma vez por ano no Tabernáculo; mas Cristo “entra de uma vez por todas no santuário nos garantindo a salvação eterna”. O Sumo Sacerdote purificava e santificava os fiéis derramando sobre eles o sangue e os restos mortais das vítimas. “Quando mais o sangue de cristo, que pelo Espírito eterno se ofereceu ele mesmo sem mácula a Deus, purificará nossa consciência das obras mortas afim de que prestemos um culto a Deus Vivo?”.
 O Evangelho (Mc. 10, 32-45) descreve a ida de Jesus a Jerusalém, antes de sua Paixão. Jesus toma à parte os doze Apóstolos e começa a lhes dizer que será preso, condenado, morto e que ressuscitará. No início da Semana Santa, nós somos levados à parte pelo Salvador para uma conversa íntima onde ele nos explica o mistério da Salvação. Nós pedimos ao Mestre para nos mostrar mais profundamente o que se passa, por nós, no Gólgota? Nós damos a Jesus a possibilidade de tal encontro secreto? Aproveitamos as ocasiões de um “tête-à-tête” com o Senhor? Pois eis que os filhos de Zebedeu se aproximam de Jesus e lhe pedem para sentar em Sua glória, um à Sua direita e outro à Sua esquerda. Jesus lhes faz - e nos faz esta pergunta: “podereis vós beber o cálice que eu bebo”? O Mestre explica pois aos discípulos que a verdadeira grandeza consiste em servir. “O Filho do homem... não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate de muitos”.

A tarde desse último domingo de Quaresma já deixa entrever os clarões da entrada na Semana Santa, domingo próximo. Domingo próximo será o domingo de Lázaro, que Jesus ressuscitou. As vésperas celebradas na tarde do quinto domingo de Quaresma anunciam já Lázaro, o pobre da parábola angélica. “Permita que eu fique com o pobre Lázaro e livra-me do castigo do rico... Concede-nos rivalizar com sua resistência e sua longevidade”. A Igreja, de certa forma impaciente para entrar nos santíssimos dias que começarão na próxima semana, nos empurra, neste último domingo de Quaresma, de ir adiante da Festa que celebramos em sete dias: “Elevemos os cantos de oferenda para Domingo de Ramos, para que o Senhor, vindo gloriosamente a Jerusalém faça morrer a morte por seu poder divino... Preparemos com fé os estandartes da vitória gritando: “Hosana ao criador de todas as coisas!”

sexta-feira, 12 de março de 2010

O Quarto Domingo da Grande Quaresma – Domingo de São João Clímaco

A Igreja chama hoje nossa atenção sobre São João Clímaco, pois esse padre, que viveu no século VII, realizou em sua vida o ideal de penitência que deveríamos manter sob a vista durante a Quaresma. “Honremos João, orgulho dos ascetas...”, é o que cantamos às Vésperas. Durante as Matinas, nós dizemos ao Santo: “Ao emagrecer teu corpo pela abstinência, tu renovaste a força de tua alma, enriquecendo-a de glória celeste”. No entanto, a Igreja dá à doutrina de São João Clímaco uma interpretação correta, quando proclama que a ascese não tem nenhum sentido nem nenhum valor se não for uma expressão de amor e quando, ainda em Vésperas, ela dirige ao Santo as seguintes palavras: “...pois a todos (nós) tu clamaste: Amai O Senhor e encontrareis a graça para sempre, pois nada é preferível ao Seu Amor...”


Nós continuamos, durante a Liturgia, a leitura da Epístola aos Hebreus (Hb. 6, 13-20). Ela nos fala da paciência e da permanência de Abraão e da realização final das promessas que Deus havia feito ao Patriarca. É impossível a Deus mentir. É por isso que, como Abraão, nós somos “encorajados”- nós que encontramos um refúgio - a agarrar fortemente a esperança que nos é oferecida.

O Evangelho (Mc. 9, 16-30) descreve a cura de um filho mudo, possuído pelo demônio, que o pai conduz a Jesus. O Senhor diz ao pai: “Se tu podes crer, tudo é possível ao que crê”. O pai do menino clama em lágrimas: “Eu creio Senhor! (porém) ajuda a minha incredulidade”. Nós não poderíamos encontrar uma melhor fórmula para expressar ao mesmo tempo a existência de nossa fé e a fraqueza dessa fé. Porém somos nós capazes de chorar com lágrimas ardentes quando dizemos à Nosso Salvador: “Eu creio... mas ajuda a minha incredulidade!”? Jesus tem piedade do pai. Ele aceita aquela fé. Ele cura o filho. Os discípulos, indo ter com o Mestre em particular, perguntam-lhe porque não puderam eles mesmos expulsar o demônio. Jesus responde: “Esta casta não pode sair com coisa alguma, a não ser com oração e jejum”. Não vamos nós, porém, acreditar, que, uma abstinência prolongada e a repetição de algumas orações sejam suficientes para dar esta força que os discípulos ainda não possuíam. A oração e o jejum, no sentido mais profundo dessas palavras, significam uma renúncia radical a si próprio, a fixação da alma nessa atitude de confiança e de humildade que tudo espera da misericórdia de Deus, a submissão de nossa vontade à vontade do Senhor, a colocação de nosso ser inteiro nas mãos do Pai. Aquele que pela graça de Deus atinge este estado pode expulsar os demônios. Não poderíamos nós tentar dar ao menos os primeiros passos nesse caminho? Se tentarmos, seremos surpreendidos pelo resultado que obteremos.

domingo, 7 de março de 2010

O Terceiro Domingo da Grande Quaresma – Domingo da Adoração da Santa Cruz

A meio da quaresma, a Igreja, ergue diante de nós a Cruz de Cristo. Duas outras vezes durante o ano, a 14 de setembro e 1 de agosto, ela propõe a Cruz à nossa lembrança e à nossa veneração. Nessas duas festas, a adoração da Cruz está ligada a episódios históricos. Porém a memória da Cruz, no terceiro domingo da quaresma, faz somente apelo à nossa fé e à nossa piedade. Trata-se de proclamar o papel da Cruz na história da Salvação e de prepararmo-nos para a visão, ainda distante, daquela Cruz que, na Sexta-feira Santa será levantada sobre o Gólgota.

Durante as Matinas, ao fim da Grande Doxologia, o presbítero coloca uma Cruz sobre uma bandeja ornada de flores. Trazendo a Cruz acima de sua própria cabeça, ele sai do Santuário e da iconostase. É precedido de velas acesas e turíbulos. Chegando ao centro do Templo, ele coloca a Cruz sobre uma mesa. Ele a incensa. O cor canta: “Nós adoramos a Tua Cruz, ó Mestre, e glorificamos a Tua Santa Ressurreição”. O povo vem beijar a Cruz, que permanece assim exposta ao Centro da nave durante toda a festa. O sentido desta encontra-se bem expresso nesse cântico de matinas: “Contemplando, neste dia, a preciosa Cruz de Cristo, adoremo-la na fé, alegremo-nos e abracemo-la ardentemente, implorando ao Senhor que foi voluntariamente crucificado que nos torne dignos de adorar sua Crua preciosa e esperar o dia da Ressurreição, libertados de toda impureza”.
 A Epístola lida à Liturgia (Hb. 4,14 a 5,6), exorta-nos, já que temos Jesus como Sumo Sacerdote, a aproximarmo-nos com certeza do trono de graça, afim de obter o perdão dos nossos pecados. “Porque não temos um Sumo Sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado”.

O Evangelho (Mc. 8,34 a9,1) nos relembra as palavras graves e prementes do Mestre: “Aquele que quiser seguir-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. Pois aquele que quiser salvar sua vida, perdê-la-á; porém aquele que perder sua vida por causa de mim e do Evangelho, salvá-la-á”. Estou eu pronto a seguir Jesus carregando a Cruz (não aquela que eu escolhi, porém aquela que Ele próprio colocará sobre meus ombros)? Quando, logo mais, eu me aproximar da Cruz exposta no meio da Igreja e lhe der um beijo, será o meu beijo o de um pecador não arrependido, um beijo de Judas, ou um gesto respeitoso e superficial que não mudará nada em minha vida, ou um sinal de adoração, de fé, de ternura que comprometerá toda a minha existência?

Evangelho do dia termina com a frase seguinte: “Em verdade vos digo que, dos que aqui estão, alguns há que não provarão a morte, sem que vejam chegado o Reino de Deus com poder”. Não se trata aqui da segunda e gloriosa vinda de Cristo, no fim do mundo. Trata-se desta vinda de Cristo com força, inaugurada pelo Pentecostes e da qual a primeira geração cristã iria ser testemunha. Porém trata-se também de uma vinda invisível, não espetacular, do Reino, na alma dos crente e fervorosos. Oh! Que possa ser meu próprio destino e que eu não morra sem que o Reino de Jesus tenha tomado posse de minha alma.

terça-feira, 2 de março de 2010

O Segundo Domingo da Grande Quaresma - Domingo de São Gregório Palamas


Evangelho do primeiro domingo de quaresma termina com uma alusão ao mistério dos anjos. E são também os anjos que a Epístola de hoje evoca (Hb. 1, 10-2; 3). O texto sagrado compara o mistério àquele infinitamente maior, do próprio Salvador. Se a desobediência às mensagens que os anjos nos transmitem é justamente punida, quão mais seria punido o homem que negligencia a salvação anunciada e trazida pelo Cristo! Pois “a qual dos anjos disse jamais: Assenta-te à minha destra até que ponha a teus inimigos por escabelo de teus pés”?
Evangelho de hoje (Mc. 2, 1-12), relata a cura do paralítico de Cafarnaum. Jesus perdoa-lhe seus pecados e, como os escribas assombram-se de que outro que não Deus possa perdoar os pecados, ele responde: “Qual é mais fácil dizer ao paralítico?: estão perdoados os teus pecados, ou dizer-lhe: levanta-te, e toma o teu leito e anda?... para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder para perdoar pecados, a ti te digo: levanta-te, toma o teu leito, e vai para tua casa”. O tema central deste episódio é a força tanto de perdão quanto de cura que possui o Senhor Jesus, A seguir, há a afirmação - mais ainda: a demonstração - de que a cura e o perdão não devem ser separados. O paralítico, deitado sobre seu leito foi colocado aos pés de Cristo. Ora, a primeira palavra de Jesus não foi: “Sê curado!”, porém: “Teus pecados te são perdoados”. Em nossos males físicos, antes mesmo de pedir por nossa libertação material nós devemos orar por nossa purificação interior, pela absolvição de nossas faltas. Jesus, enfim, ordena ao paralítico curado,de levar sua cama para casa. De um lado, a multidão seria convencida da realidade do milagre se visse esse homem tornado forte o bastante para carregar seu leito. De outro lado, aquele que foi perdoado, interiormente modificado por Jesus, deve mostrar aos de sua casa, por qualquer sinal evidente (não mais por carregar um leito, porém, por palavras, atos e atitudes), que ali está um homem novo que retoma seu ligar em seu ambiente.

Notaremos que a Epístola e o Evangelho desse dia não possuem nenhuma relação com São Gregório Palamas, apesar do calendário associar seu nome ao segundo domingo de Quaresma. É que a comemoração de Palamas só foi introduzida no século XIV quando a estrutura litúrgica desse domingo já encontrava-se fixadas segundo outras linhas. A memória de São Gregório Palamas é evocada nos ofícios de Vésperas e Matinas. São Gregório Palamas expôs e defendeu, no decorrer de vivas controvérsias, a doutrina teológica relativa à “Luz” divina. Os textos do ofício não entram nos detalhes ou precisões sobre os conceitos próprios a Palamas, mas falam de uma maneira geral da luz e D’Aquele que disse: “Eu sou a luz do mundo”. Em um resumo bastante substancial, um dos textos de Matinas associa três idéias: a do Cristo que ilumina os pecadores e da abstinência de Quaresma e a da palavra “levanta-te”, que o Salvador dirigiu ao paralítico e que nós dirigimos agora à ele próprio: “Tu trouxeste, Ó Cristo, a luz àqueles que viviam nas trevas do pecado, neste tempo de abstinência. Mostra-nos então o dia glorioso de Tua Paixão, afim de que possamos clamar à Ti: Levanta-Te, ó Deus, e tem piedade de nós!”